O Liber Juratis, também conhecido como O Livro Jurado de Honorius ou Grimório de Honorius, é um dos manuscritos mais obscuros e intrigantes do ocultismo medieval. Desde a Idade Média, sua reputação ecoa como um misto de temor e fascínio, carregando a marca de um texto amaldiçoado, revelador de rituais arcanos, conjurações angelicais e invocações que prometiam unir o magista ao poder divino — mas sempre a um preço.
Sua origem remonta, segundo a tradição, ao Papa Honório III (1150–1227), figura envolta em lendas. Há quem acredite que o grimório foi escrito por ordem dele próprio, em um ato paradoxal: o líder supremo da Igreja teria permitido a transmissão de segredos mágicos proibidos para proteger a humanidade da condenação espiritual. Outros estudiosos defendem que a atribuição a Honorius é uma estratégia literária medieval, usada para dar autoridade ao texto.
Independentemente da autoria, o Liber Juratis tornou-se uma das obras mais influentes e enigmáticas da tradição mágica ocidental, citado em manuscritos posteriores e mantido em segredo por séculos, circulando apenas entre iniciados.

O sussurro do Liber Juratis: um grimório de poder e perigos
O próprio nome “juratis” sugere juramento, compromisso. Longe de ser um manual para curiosos, o Liber Juratis exige do praticante uma dedicação solene, um voto espiritual que o vincula não apenas às práticas nele descritas, mas também às consequências do seu uso.
Os rituais apresentados no grimório abrangem desde a invocação de anjos e arcanjos até conjurações que prometem visões proféticas, domínio sobre espíritos e revelações cósmicas. Há instruções específicas para contato com entidades como Miguel, Gabriel e Uriel, misturando fórmulas da tradição cristã com práticas que lembram a Cabala e elementos da magia salomônica.
No entanto, a linha entre devoção e heresia era tênue. Possuir ou praticar o conteúdo do Liber Juratis podia condenar alguém à fogueira, não por acaso: sua promessa de poder era tão tentadora quanto perigosa.
Estrutura e segredos do Liber Juratis
Os manuscritos sobreviventes do Liber Juratis apresentam uma estrutura que oscila entre instruções práticas e discursos teológicos. O magista é instruído a jejuar, confessar-se e purificar-se antes de realizar as conjurações. É exigida uma vida regrada, quase monástica, como se apenas a pureza pudesse abrir o véu dos mistérios.
O texto descreve:
- Selos sagrados e símbolos: diagramas que funcionariam como chaves para o contato com as hierarquias celestiais.
- Orações secretas: invocações que misturam passagens bíblicas e fórmulas enigmáticas.
- Visões místicas: instruções para contemplar o “trono da glória de Deus” e penetrar no conhecimento proibido da Criação.
Um detalhe pouco conhecido é que o grimório enfatiza a intenção pura do praticante. Não basta repetir palavras; é preciso estar em harmonia espiritual. Isso o diferencia de outros textos mágicos, nos quais o ritual técnico parece bastar.
Adentrando o Labirinto de Poder
O Liber Juratis não é um mero conjunto de feitiços aleatórios. É um sistema complexo e rigoroso de magia ceremonial, um caminho de ascese espiritual que exige absoluta devoção e disciplina. Seu título, frequentemente traduzido como “Livro dos Juramentos”, refere-se aos solenes pactos que o operador deve fazer para garantir a eficácia e a segurança dos rituais.
Os Juramentos de Sangue e Espírito
Antes de qualquer operação mágica, o aspirante a mago deve se submeter a uma série de votos solenes. Estes juramentos são a chave mestra do sistema. Eles não são meras formalidades; são pactos vinculantes que consagram a vida do operador ao seu trabalho espiritual. Através deles, o mago se compromete com a pureza, a secrecidade e o uso ético (ou pelo menos, controlado) dos poderes que pretende conquistar. É uma iniciação que separa o profano do sagrado, transformando o homem comum em um canal para forças colossais.
A Theurgia das Esferas Celestes
A primeira e mais “pura” parte do Liber Juratis é dedicada à Theurgia – a magia branca ou divina, focada na invocação de entidades angelicais. O texto fornece diagramas complexos (círculos mágicos), orações em latim corrupto e selos sigilares para cada anjo dos sete céus planetários clássicos.
Cada dia da semana é governado por um arcanjo específico (e.g., Miguel no Domingo, Rafael na Quarta-feira), e o grimório detalha meticulosamente os rituais para invocá-los. O objetivo? Obter conhecimento divino, sabedoria, cura e proteção. O operador, vestido com vestes ritualísticas e munido de instrumentos consagrados (como uma espada, um sino e um anel), busca se elevar espiritualmente, forjando uma aliança com as potências da luz. É uma busca pela iluminação através da ordem e da hierarquia celestial.
O peso histórico do Grimório de Honorius
Durante a Idade Média e a Inquisição, grimórios como o Liber Juratis eram alvo de censura, perseguição e destruição. Muitos manuscritos desapareceram, queimados junto aos acusados de bruxaria. O que sobreviveu chegou até nós em cópias fragmentadas, preservadas por colecionadores e estudiosos do oculto.
O estudioso Joseph H. Peterson, em sua tradução de 2016 (Liber Juratus Honorii, Ibis Press), mostra como o texto é um mosaico de tradições mágicas cristãs e judaicas, refletindo a complexidade do pensamento esotérico medieval. Ele conecta o grimório com práticas cabalísticas e também com textos apócrifos como o Livro de Enoque, evidenciando sua natureza híbrida e misteriosa.
Assim, o Liber Juratis é mais do que um manual de feitiçaria: é um testemunho de como o sagrado e o profano se entrelaçaram na busca humana por poder, proteção e revelação.

Liber Juratis e a herança oculta da magia medieval
A influência do Liber Juratis pode ser sentida em obras posteriores, como o Lemegeton (A Chave Menor de Salomão) e o Heptameron de Pietro d’Abano. Seus selos e orações ecoaram em tradições de magia cerimonial, moldando práticas que atravessaram séculos.
No blog bandoleiro.com, onde os mistérios do oculto se encontram com a curiosidade moderna, o Liber Juratis representa um elo entre o passado sombrio e a busca contemporânea por conhecimento místico. Ler suas palavras é como abrir uma porta para a mentalidade medieval, onde cada rito era um risco e cada visão, uma possível condenação.
O Grimório do Papa Mago: O Pontífice das Chaves Mágicas
A tradição atribui a autoria do Liber Juratis a Honório III, que ocupou o papado de 1216 a 1227. Um homem de Deus, um líder da Igreja Católica, o suposto arquiteto de um sistema mágico que prometia poder absoluto sobre as hostes celestiais e infernais. Como é possível tal contradição?
A lenda, alimentada pelo próprio texto, narra uma história fascinante. Insatisfeito com a ineficácia das preces comuns para conter a heresia e o mal no mundo, o Papa Honório teria convocado um concílio de magos e sábios. Sob sua orientação, e após três dias de jejum e oração, ele teria recebido uma visão divina.
O Arcanjo Miguel himself lhe teria entregue este grimório, um compêndio de orações, selos e conjurações de poder incontestável, destinado a ser usado apenas pelos mais puros e corajosos servos da fé. Era a arma definitiva, forjada no céu para ser usada na Terra.
Uma Batalha entre a Fé e a Fraude
Estudiosos modernos, é claro, contestam veementemente esta origem. A análise linguística e contextual do texto aponta para uma provável datação muito posterior, possivelmente do final do século XIV ou início do século XV. A linguagem e os conceitos refletem uma amalgama de tradições mágicas medievais, influências da Cabala judaica e elementos de grimórios anteriores, como a Chave de Salomão.
A hipótese mais aceita é que a atribuição a um Papa foi uma estratégia deliberada – um artifício literário conhecido como “pseudepigrafia” – para conferir autoridade e imunidade ao texto. Num período em que a perseguição pela Inquisição se intensificava, qual melhor proteção para um livro de magia do que afirmar que foi escrito pelo próprio líder da Cristandade? Era um golpe de mestre retórico: como condenar um livro que alegava ser um presente divino para um Papa?
A Sombra que Dança na Luz: A Goécia e os Pactos
Contudo, é na segunda parte do livro que reside sua infâmia mais duradoura e o fascínio mais sombrio. O Liber Juratis avança sem hesitação para a Goécia – a arte de conjurar e comandar espíritos infernais, demônios e as potestades das trevas.
Aqui, a natureza do texto se torna profundamente ambígua. Ele não apresenta uma clara divisão maniqueísta entre “bem” e “mal”. Em vez disso, opera sob a premissa de que todas as criaturas, celestes ou infernais, são, em última análise, subservientes a Deus e podem ser compelidas a servir a um operador que possua a autoridade correta – autoridade esta concedida pelos juramentos e pelos nomes secretos de Deus revelados no livro.
O grimório contém uma lista de demônios, cada um com seus selos de controle, suas especialidades (como encontrar tesouros, destruir inimigos, adquirir conhecimentos mundanos) e as conjurações específicas para forçá-los a obedecer. O mago não faz um “pacto” no sentido faustiano de vender a alma; ele comanda através de um poder hierárquico superior, usando os nomes de Deus como uma chave mestra para as fechaduras do universo.

Liber Juratis: Sangue e Promessas
No silêncio úmido das masmorras espirituais, onde velas negras gotejam cera como lágrimas petrificadas, há um livro que jamais deveria ter sido escrito. Dizem que quem o abre já está condenado — não por seus demônios, mas por seu desejo. Porque o Liber Juratis não escolhe mestres; ele reconhece almas marcadas pelo fogo da curiosidade incontrolável, aquelas que ousam perguntar: “O que há além da bênção?”
Seu nome, em latim arcaico, significa “Livro dos Juramentados”, pois todos os que dele bebem conhecimento devem selar um juramento com sangue, palavra ou alma.
Poucos registros históricos confirmam a existência real de Honorius de Tebona. Alguns pesquisadores apontam para uma cidade desconhecida no sul da França; outros sugerem que “Tebona” seja uma anagramatização simbólica de Thebaide, referência aos eremitas egípcios. O que permanece inegável é a força simbólica desse nome na literatura demonológica.
Segundo tradições orais preservadas em círculos herméticos, Honorius era um clérigo do século XIII que, após estudar textos proibidos nos arquivos secretos do Vaticano, descobriu que os anjos e demônios não eram criaturas divinas ou satânicas, mas entidades cósmicas manipuláveis através de palavras sagradas, gestos rituais e oferendas precisas. Revoltado com o dogma, ele escreveu o Liber Juratis como um ato de libertação — ou de vingança.
A Igreja Católica, temendo o poder disseminado por essas páginas, condenou o texto ao fogo eterno. Em 1258, o Papa Alexandre IV incluiu o Liber Juratis na bula Constitutio contra maleficia, declarando-o “instrumento de perdição e abertura para legiões infernais”. Apesar disso, cópias clandestinas circularam por séculos, copiadas à mão por monges renegados, alquimistas solitários e feiticeiros da floresta negra.
Hoje, versões do grimório surgem em coleções privadas, sempre com páginas faltando — como se o próprio livro se mutilasse para proteger seus segredos mais profundos.
Os Três Círculos do Poder
O perigo do Liber Juratis não está apenas nos espíritos que evoca, mas na maneira como altera a percepção da realidade. Usuários relatam fenômenos psíquicos: sons de vozes em línguas desconhecidas, visões de corredores infinitos refletidos em espelhos, e a sensação de ser observado por algo que habita atrás da pele.
Primeiro Círculo: A Invocação dos Sete Príncipes
O Liber Juratis é estruturado em três grandes partes, conhecidas como “Círculos”. O primeiro contém os rituais para invocar os Sete Príncipes Regentes, entidades que governam as direções do tempo, os elementos e os destinos humanos. Diferentemente da Goetia, que lista 72 demônios, o grimório de Honorius foca em seres muito mais antigos — alguns pré-adâmicos, outros mencionados apenas em textos apócrifos como o Livro de Enoque.
Entre eles está Amaymon, rei do Oriente, associado ao fogo primordial e ao conhecimento proibido; e Belial, não como figura satânica, mas como guardião da soberania interior — aquele que testa o mago com tentações de poder absoluto. Cada invocação exige um altar específico, símbolos traçados em sal consagrado, e um jejum de sete dias sob lua minguante.
Um detalhe perturbador: o grimório exige que o invocador não pronuncie seu próprio nome durante o ritual. Em vez disso, deve assumir um “nome de sombra”, revelado apenas após um sonho profético. Isso sugere que o verdadeiro poder só é alcançado quando a identidade terrena é abandonada.
Segundo Círculo: Os Sinais nas Estrelas
Aqui, o Liber Juratis transcende a magia operativa e adentra a astrologia ritualística. Este círculo ensina como alinhar os feitiços com os movimentos celestes, especialmente durante os eclipses e as conjunções raras de Saturno e Marte. Há fórmulas para criar talismãs com metais fundidos sob constelações específicas — como o bronze de Vênus, usado para atrair amor fatídico.
Mas o mais sinistro é o capítulo sobre os Anjos Caídos que Ainda Falam, onde se afirma que certos espíritos, como Azazel e Semyaza, podem transmitir conhecimentos através de cristais negros, desde que alimentados com gotas de sangue menstrual ou vinho tinto derramado sobre terra de cemitério.
Essas práticas ecoam tradições cabalísticas e gnósticas, especialmente os ensinamentos dos Nephilim, descendentes híbridos de anjos e humanas. O grimório parece saber coisas que jamais deveriam ter sido registradas.
Terceiro Círculo: O Juramento Final
O último círculo é o mais obscuro — tanto que muitas cópias estão incompletas ou deliberadamente corrompidas. Ele trata do Juramento do Silêncio, um pacto final que transforma o leitor em guardião do Liber Juratis. Quem completa os rituais deste círculo supostamente ganha acesso a uma dimensão paralela, chamada Atrium Obscurum, onde todas as verdades ocultas são escritas em muralhas vivas.
Mas há um preço. O grimório avisa: “Quem entrar no Terceiro Círculo jamais retornará como era. O tempo o esquecerá. Seus nomes serão apagados das memórias dos vivos.”
Relatos contemporâneos, como os do ocultista francês Étienne Lalande (1903), afirmam que pessoas que tentaram completar esse ciclo simplesmente desapareceram — sem rastro, sem corpo, sem testamento. Suas casas permaneciam intactas, com velas ainda acesas e o Liber Juratis aberto na página do Juramento.
O Legado Proibido: Cópias Malditas e Guardiões Fantasmas
Apesar de sua proibição, cópias do Liber Juratis surgiram ao longo dos séculos. Uma delas, conhecida como Codex Nigrum, foi encontrada em 1921 nas ruínas de um mosteiro beneditino na Transilvânia. Escrita em pergaminho tingido com extrato de beladona, suas páginas exalam um cheiro doce e metálico — descrito por pesquisadores como “cheiro de sangue antigo”.
Atualmente, cópias raras são guardadas em bibliotecas secretas, como a Bibliotheca Arcana em Praga e o Archivum Nocturnum na Suíça. Algumas dessas instituições exigem que os leitores assinem um contrato com cláusulas bizarras: não copiar trechos, não mencionar o conteúdo em voz alta, e devolver o livro antes do amanhecer.
No Brasil, relatos de possessões ligadas ao Liber Juratis surgiram em comunidades esotéricas do sul do país, onde um grupo anônimo teria realizado rituais baseados em traduções clandestinas. Testemunhas afirmam que, após uma cerimônia em pleno solstício de inverno, todos os participantes caíram em coma simultâneo — acordando dias depois sem memória, exceto por uma frase repetida em uníssono: “O Juramento está selado.”

Conclusão: Você Está Pronto para Jurar?
O Liber Juratis não é apenas um grimório. É um espelho. Reflete não o rosto do leitor, mas sua alma mais oculta — aquela parte que anseia pelo proibido, que deseja romper as correntes do mundo comum. Ele oferece poder, sim, mas também solidão, desintegração e talvez até a aniquilação do eu.
No Bandoleiro.com, mergulhamos nos mistérios que a luz oficial prefere ignorar. Aqui, celebramos a sabedoria ancestral, os caminhos esquecidos, os livros que queimam as mãos dos fracos. Se o Liber Juratis chama seu nome, não fuja. Mas também não corra. Aproxime-se com cautela. Estude. Medite. E pergunte-se: qual é o preço que você está disposto a pagar pelo véu se rasgar?
Porque, como diz um antigo aforismo encontrado nas margens de um manuscrito do Liber Juratis:
“Quem abre o livro fecha os olhos para o mundo. E quem fecha os olhos… nunca mais os abre da mesma forma.”
Chegamos, portanto, ao enigma central que o Liber Juratis nos deixa. Foi ele uma heresia blasfema, um embuste elaborado por magos medievais para se protegerem e inflarem seu próprio poder? Ou será que contém um vislumbre de uma teologia muito mais complexa e sombria, uma que a Igreja oficial jamais ousou abraçar?
A obra desafia nossnoções convencionais. Ela sugere que a verdadeira autoridade espiritual não reside apenas na fé passiva, mas num conhecimento ativo dos mecanismos ocultos da criação. Propõe que o divino e o demoníaco são duas faces da mesma moeda cósmica, e que a vontade humana devidamente treinada e consagrada pode navegar por ambas as correntes.
O que permanece é um convite à reflexão, não sobre a autenticidade histórica do papa Honório, mas sobre a natureza do poder e do sacrifício. O Liber Juratis não é um livro para ser lido; é um caminho para ser percorrido. Ele pergunta a você, leitor do bandoleiro.com: que juramentos você estaria disposto a fazer? Que partes de sua humanidade você sacrificaria em troca de um fragmento do poder dos deuses?
E, finalmente, existe alguma diferença real entre uma prece e um encantamento, entre um santo e um mago, quando ambos buscam canalizar o infinito através do frágil vaso de carne e osso que somos? O grimório permanece em silêncio, guardando suas respostas para aqueles que ousam jurar fidelidade aos seus segredos.
Estudar o Liber Juratis é se aproximar de um fogo que tanto aquece quanto queima. Um fogo que iluminou monges, alquimistas e magos, mas que também consumiu muitos em silêncio.
E você, leitor de bandoleiro.com, ousaria fazer o juramento? Ou recuaria diante da promessa perigosa de sabedoria proibida?
Fontes consultadas:
- Peterson, Joseph H. Liber Juratus Honorii: The Sworn Book of Honorius. Ibis Press, 2016.
- Kieckhefer, Richard. Forbidden Rites: A Necromancer’s Manual of the Fifteenth Century. Pennsylvania State University Press, 1997.
- Davies, Owen. Grimoires: A History of Magic Books. Oxford University Press, 2009.